OS PROCESSOS PARA COMPOSIÇÃO DO RESULTADO CONTÁBIL E APURAÇÃO DO IRPJ E DA CSLL

OS ASPECTOS GERAIS DA CONTABILIDADE TRIBUTÁRIA

 As IFRS (International Financial Reporting Standards) são normas globais de contabilidade, bem como a união de pronunciamentos contábeis internacionais, sendo divulgados e examinados pelo IASB (International Accounting standards Board – Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade).

Nesse sentido, vale destacar que as IFRS não são regras propriamente ditas, ou seja, suas deliberações não têm essência compulsória. Dessa forma, as normas configuram como referência técnica para os padrões internos de cada país, no sentido de promover a harmonização internacional (Santos, 2015).

A adoção das IFRS no Brasil gerou grandes mudanças na contabilidade brasileira, inclusive criando um panorama complexo no que tange a área tributária, principalmente para a formação da base de cálculo do Imposto sobre a Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

A efetivação da IFRS no Brasil se concretizou por meio da Lei 11.638/2007, que adicionou e modificou vários artigos da Lei 6.404, de 1976 (Leis das sociedades por Ações), inserindo no Brasil as diretrizes internacionais de contabilidade, sendo as normas aprovadas e divulgadas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).

O CPC foi criado pela Resolução CFC nº 1.055/2005. Seu papel dentro da contabilidade é de extrema importância, pois exerce uma posição fundamental à convergência das IFRS, dado que ao concentrar o processo de produção dos padrões técnicos de contabilidade, proporciona a conformidade interna, o que, por si só, já oferece várias benesses.

O objetivo do CPC é estudar, preparar e emitir os procedimentos contábeis, a fim de permitir que as entidades reguladoras brasileiras possam divulgar as normas, com intuito de unir e padronizar os processos, visando à convergência da contabilidade aos moldes internacionais (Santos, 2015).

Posteriormente, após a criação da Lei 11.638/2007, foi criada a Lei 11.941 de 27/05/2009, que tratou dos ajustes tributários no Lucro real. Essa Lei criou o Regime Tributário de Transição (RTT), que tratava dos ajustes tributários da contabilidade internacional e valeria até que uma nova Lei regulasse os impactos dos novos critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária.

Prontamente, para garantir que a migração das IFRS não impactaria nas regras fiscais, o artigo 7º da IN RFB nº 949, de 2009, criou o FCONT (Controle Fiscal Contábil de Transição) para fins de registros auxiliares, sendo obrigatório às pessoas jurídicas sujeitas ao regime do lucro real e ao regime tributário de transição (RTT).

Na sequência, no ano de 2014, deu início à Lei nº 12.973, que extinguiu o Regime Tributário de Transição e a obrigação acessória FCONT. A referida Lei trouxe as adaptações da legislação tributária aos critérios contábeis inseridos pelas regras da Contabilidade Internacional.

As principais alterações trazidas pela Lei 12.973/2014 foram as de: adequação da legislação tributária aos métodos contábeis; a extinção do Regime Tributário de Transição; a alteração do artigo 7º do Decreto-Lei 1.598/77 pelo artigo 2º que trata do imposto de renda e contribuição social no Lucro real; o conceito de receita bruta; o limite mínimo para imobilização; as despesas com financiamento para estoque de longa maturação; os juros pagos sobre o capital; as despesas pré-operacionais; o teste de “impairment”; depreciação econômica excedente ao da fiscal e o arrendamento mercantil financeiro.

Após o início da Lei nº 12.973/2014, a contabilidade tornou-se importantíssima para as apurações dos tributos sobre o lucro. Pautada pela neutralidade tributária, essas normas instauram uma fase importante para legislação fiscal e para a própria prática contábil no Brasil, criando parâmetros para a composição do resultado contábil e para a base do lucro real (Neves e Viceconti, 2021).

Para apuração da base do lucro real, um fato importante foi a criação da Instrução Normativa 1.700/2017, que revogou a IN 1.515/2014. Um ponto importante trazido pela IN 1.700/2017 e complementada pela IN 1.881/2019, foram as divulgações dos anexos I a XI.

Os anexos I e II estão relacionadas às adições e às exclusões, dados importantes para os cálculos do imposto de renda e da contribuição social no lucro real. O anexo III informa o prazo de vida útil e as taxas anuais de depreciação dos bens do ativo imobilizado. Por fim, os anexos IV a XI tratam das alterações trazidas pelas normais contábeis internacionais, sendo elas a adoção inicial e a utilização das subcontas.

No que tange a legislação fiscal, em 2018, ocorreu mais uma iniciativa para simplificação do sistema tributário. Foi publicado o Decreto nº 9.580/2018, mais conhecido como RIR/2018. Esse decreto é também a consolidação e revisão completa do Decreto 3.000/1999. Assim, o RIR/2018 regulamentou e consolidou as normas fiscais de tributação ocorridas até 31/12/2016.

Por fim, as legislações contábil e tributária sofreram diversas modificações ao longo dos anos. Essas mudanças e atualizações foram necessárias para garantir a harmonização das normas, bem como a neutralidade tributária, fatores importantes para a apuração do resultado contábil e da base do lucro real.

Linha do tempo das normas contábeis e tributárias

Ano 2007 – Lei 11.638/2007 Iniciou o IFRS no Brasil, no­vos métodos e cri­té­rios das nor­mas contá­beis.
Ano 2009  – Lei 11.941/2009 Criou RTT para neutralizar os efeitos e crité­rios contábeis para fins fis­cais.
Ano 2009 – IN RFB nº 949 Criou FCONT para fins auxi­liares do con­trole fiscal e contábil.
Ano 2017 – IN RFB nº 1.700/2017 Dispõem sobre a determinação e o pagamento do IRPJ e CSLL.
Ano 2018 – Decreto 9.850/2018 Consolidação das normas do imposto de renda.

O FATO GERADOR DOS TRIBUTOS SOBRE O LUCRO

O imposto de renda encontra-se previsto no artigo 153, III, da Constituição Federal do Brasil, sendo o fato gerador do imposto definido pelo artigo 43, I, II, do Código Tributário Nacional [CTN], que estabelece como sendo a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de proventos de qualquer natureza não incluídos no conceito de renda.

A contribuição social está prevista no artigo 195, I, da Constituição Federal do Brasil, sendo regulamentada pela Lei nº 7.689/88, com o propósito de financiar a seguridade social, tendo como incidência o lucro líquido das pessoas jurídicas domiciliadas no país ou a ela equiparada.

Em esfera de legislação ordinária, aplicado às pessoas jurídicas, o fato gerador do imposto de renda é estimado com base no lucro real, presumido e arbitrado. Por outro lado, a contribuição social incide sobre o lucro líquido ajustado.

A base de cálculo é medida pelo fato gerador, sendo que, para ambos os tributos, o fator principal é a obtenção de renda e de lucro, observados por um conjunto complexo de normas (Andrade, 2018).

A expressão lucro real encontra-se descrita no art. 6º do Decreto-lei nº 1.598/77, que é a base legal do artigo 258 do RIR/2018. Vejamos:

Art. 258. O lucro real é o lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas por este Regulamento (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 6º, caput) (RIR, 2018).

  • 1º A determinação do lucro real será precedida da apuração do lucro líquido de cada período de apuração em observância às disposições das leis comerciais (Lei nº 8.981, de 1995, art. 37, § 1º). (RIR, 2018).
  • 2º Os valores que, por competirem a outro período de apuração, forem, para efeito de determinação do lucro real, adicionados ao lucro líquido do período de apuração, ou dele excluídos, serão, na determinação do lucro real do período de apuração competente, excluídos do lucro líquido ou a ele adicionados, respectivamente, conforme o Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 6º, § 4º. (RIR/2018).

Percebe-se que o ponto inicial para apuração do lucro real é o lucro líquido, cuja definição encontra-se no artigo 259 do RIR/2018, a saber:

Art. 259. O lucro líquido do período de apuração é a soma algébrica do lucro operacional, das demais receitas e despesas, e das participações, e deverá ser determinado em observância aos preceitos da lei comercial (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 6º, § 1º, e art. 67, caput, inciso XI; Lei nº 7.450, de 1985, art. 18; e Lei nº 9.249, de 1995, art. 4º). (RIR/2018).

Portanto, é a partir do lucro líquido que se forma a base de apuração do lucro real, em que devem ser feitos ajustes de adição, exclusão ou compensação.

Ademais, é necessário observar um amplo conjunto de normas jurídicas que estabelecem critérios relativos às dedutibilidades de despesas, custos e perdas em geral, bem como a exclusão de certos acréscimos patrimoniais situados nos campos de incidência dos tributos.

O LUCRO CONTÁBIL COMO BASE PARA APURAÇÃO DO LUCRO REAL

As normas contábeis e as normas fiscais possuem a mesma hierarquia, ou seja, é inadequado estabelecer ordem de importância de uma em relação à outra. Possíveis embates podem ocorrer, visto que as normas de direito tributário, relativos ao imposto de renda e contribuição social, incidem sobre fatos que nem sempre estão de acordo com as normas contábeis.

Assim, os conflitos existirão, pois as finalidades são diferentes. Enquanto a contabilidade tem como intuito demonstrar o lucro societário, as normas tributárias têm como propósito os cálculos dos tributos.

Para a apuração do resultado contábil, as empresas utilizam a DRE (Demonstração do Resultado do Exercício). Para fins da legislação societária, a DRE encontra-se prevista na NBC nº 26 do Conselho Federal de Contabilidade e Pronunciamento técnico CPC nº 26 (Neves e Viceconti, 2021).

O objetivo da DRE é a demonstração de forma resumida do resultado apurado em relação às operações de um determinado período, sempre pelo regime de competência.

Na demonstração do resultado serão informadas as operações com as receitas e os rendimentos e ganhos no período, bem como os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, relacionados com essas receitas e rendimentos, independentemente da sua realização em moeda.

Cabe destacar que a apuração do lucro real pressupõe a aplicação, de início, das normas contábeis, apurando o resultado contábil por meio da DRE, sendo este demonstrativo o ponto sobre o qual incidem as normas tributárias.

Avista-se logo que a base do lucro real é formada por diversos fatores que precisam ser registrados na contabilidade, sendo certo que é a fonte formal dos elementos necessários para apuração da base do imposto de renda e da contribuição social. É por esse motivo que o fato gerador dos tributos sobre o lucro é visto como complexo, pois todas as operações devem ser classificadas na contabilidade e, por conseguinte, serve como fonte principal para reunir os componentes necessários para a apuração do lucro real (Andrade, 2018).

Nesse caminho, após ser apurado o lucro contábil com base nas normas brasileiras de contabilidade, faz-se necessário os ajustes de adição, exclusão e compensação.

Os ajustes são informados no e-LALUR, livro eletrônico de apuração do lucro real, e no e-LACS, livro de apuração da base de cálculo da contribuição social. Esses livros são utilizados de forma exclusiva para fins fiscais, sendo destinados ao controle extracontábil para o cálculo do lucro real.

Os livros e-LALUR e e-LACS possuem duas partes, sendo uma a Parte A e a outra a Parte B.

A Parte A é utilizada para os registros de ajustes do lucro líquido, sendo as adições, exclusões e compensações. Por outro lado, a Parte B é destinada puramente ao controle dos valores que não estejam escriturados na contabilidade, porém que influenciarão na base do lucro real nos períodos subsequentes. Por exemplo: os prejuízos fiscais, depreciação acelerada, entre outros.

Os livros serão informados na obrigação acessória ECF (Escrituração contábil fiscal), precisamente no bloco M. Vejamos:

Exemplos dos registros na Parte A e Parte B na ECF.

Parte A Parte B
Bloco M300, lançamentos da Parte A do e-LALUR Bloco M410: Lançamento na Conta da Parte B do e-LALUR e do e-LACS sem Reflexo na Parte A
Bloco M350, lançamentos da Parte A do e-LACS Bloco M500: Controle de Saldos das Contas da Parte B do e-LALUR e do e-LACS
O lucro ou prejuízo líquido constante da escrituração comercial, apurado no período de apuração Receitas de variações cambiais diferidas até o momento de sua realização
As adições ao lucro líquido, discriminadas itens por item, agrupados os valores de acordo com sua natureza, e a soma das adições Receitas de deságios de investimentos avaliados por equivalência patrimonial diferidos até a realização daqueles investimentos
As exclusões do lucro líquido, discriminadas item por item, agrupados os valores de acordo com sua natureza, e a soma das exclusões Valores relativos à depreciação acelerada incentivada e despesas de variações cambiais diferidas até o momento de sua realização
Subtotal, obtido pela soma algébrica do lucro ou prejuízo líquido do período com as adições e exclusões Custos ou despesas não dedutíveis no período de apuração em decorrência de disposições legais ou contratuais
As compensações que estejam sendo efetivadas no período, cuja soma não poderá exceder a 30% do valor positivo Despesas de ágios amortizados de investimentos avaliados por equivalência patrimonial diferidos até a realização daqueles investimentos
O Lucro Real do período, ou o prejuízo fiscal do período compensável em períodos subsequentes Prejuízos fiscais de períodos de apuração anteriores, sejam operacionais ou não operacionais

Por fim, vale destacar que todos os procedimentos para obtenção da base do lucro real encontram-se detalhados nas Instruções normativas 1.700/2017 e 1.881/2019, sendo disponibilizados em seus anexos a lista detalhada das adições e exclusões, garantido assim a harmonização entre as normas contábeis e fiscais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento deste estudo permitiu uma análise sobre os processos de composição do resultado contábil e de equacionamento do lucro real, com vistas às quantificações do imposto sobre a renda e da contribuição social sobre o lucro líquido. Além disso, possibilitou também a compreensão da neutralidade e harmonização das normas contábeis e tributárias, sendo fator importante para o cálculo dos tributos.

Nessa perspectiva, demonstrou que contabilidade apresenta o resultado para fins societários, sendo as informações imprescindíveis para as tomadas de decisões e divulgação da realidade financeira, bem como do potencial econômico da empresa.

Por outro turno, observou-se que composição da base do lucro real, elaborada por meio do e-lalur e e-lacs, tem finalidade exclusivamente arrecadatória, sendo aplicada as normas tributárias para fins dos cálculos dos tributos sobre o lucro.

Assim, constatou-se que para a composição da base do lucro real se faz necessário o conhecimento nas normas contábeis e tributárias, visto que ambas as legislações são indispensáveis para apuração e cálculo do imposto de renda e da contribuição social.

REFERÊNCIAS

Andrade Filho, E.O. 2018. Imposto de Renda das Empresas. 13ed. GEN/Atlas, São Paulo, SP, Brasil.

Brasil. 2018. Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018. Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Diário Oficial da União, Brasília, 22 nov. 2018. Seção 1, p. 57.

Brasil. 2017. Instrução Normativa RFB n. 1.700, de 14 de março de 2017. Dispõe sobre a determinação e o pagamento do imposto sobre a renda e da contribuição social sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas e disciplina o tratamento tributário da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no que se refere às alterações introduzidas pela Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014. Diário Oficial da União, Brasília, 16 mar. 2017. Seção 1, p. 23.

Nevez, S.: Vicenti, P.E.V. 2021. Curso Prático de Imposto de Renda Pessoas Jurídicas e Tributos Conexos – CSLL, PIS, Cofins. 19ed. Thomson Reuters – Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, SP, Brasil.

Santos, M. A. 2015. Contabilidade tributária um enfoque nos IRFS e na Legislação do IRPJ. 1ed. Atlas, São Paulo, SP.

Autor: Willian Romual

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